quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Plataforma Organizacional

PREFÁCIO (À primeira edição irlandesa, publicada pelo Worker's Solidarity Movement) Em 1926, um grupo de anarquistas russos exilados na França, o Dielo Truda (Causa Operária), publicou este panfleto. Ele não surgiu de um estudo acadêmico, mas de suas experiências na revolução Russa de 1917, quando participaram da derrubada da velha classe dominante, e do desabrochamento dos conselhos operários e camponeses, compartilharam o otimismo generalizado de um novo mundo socialista e livre... e testemunharam sua sangrenta substituição pelo estado capitalista e pela ditadura do partido bolchevique. O movimento anarquista russo não era uma parcela insignificante na revolução. Na época, havia uns 10.000 ativistas anarquistas na Rússia, sem incluir o movimento na Ucrânia, liderado por Nestor Makhno. Havia no mínimo quatro anarquistas, no Comitê Militar Revolucionário dominado pelos bolcheviques que organizaram a tomada do poder em outubro de 1917. Significativamente, os anarquistas estavam inseridos nos comitês de fábricas que haviam surgido depois da revolução de Fevereiro. Esses comitês formaram-se nos locais de trabalho, eram eleitos pela assembléia dos trabalhadores e realizavam a supervisão do funcionamento da fábrica e sua coordenação com outros locais de trabalho, na mesma indústria ou região. Os anarquistas eram particularmente influentes entre os mineiros, estivadores, carteiros, padeiros; tiveram uma atuação importante na Conferência dos Comitês de Fábricas Russas, que ocorreu em Petrogrado, às vésperas da revolução. Os anarquistas viam esses comitês como uma base para a nova autogestão, que seria encaminhada depois da revolução. Porém, o espírito revolucionário e a unidade de outubro de 1917 não duraram muito. Os bolcheviques estavam ansiosos para suprimir todas as forças de esquerda, que consideravam como obstáculos no caminho para o poder de "um só partido", o deles. Os anarquistas e alguns outros setores da esquerda acreditaram que a classe operária era capaz de exercer o poder, através de seus próprios comitês e sovietes (conselhos de delegados eleitos). Os bolcheviques pensavam diferente, que os trabalhadores ainda não eram capazes de assumir seu próprio destino e que, portanto, os bolcheviques tomariam o poder e o exerceriam interinamente durante um "período de transição". Essa falta de confiança nas capacidades das pessoas comuns e a usurpação do poder acarretou a traição dos interesses, esperanças e sonhos da classe operária. Em Abril de 1918, as sedes anarquistas em Moscou foram atacados, 600 anarquistas presos e muitos assassinados. O pretexto alegado foi o de que os anarquistas eram "incontroláveis" - não importa o que isso tenha significado, a não ser pelo simples fato de recusarem obediência aos líderes bolcheviques. Mas o motivo real foi a formação da Guarda Negra, que havia surgido para lutar contra as provocações brutais e os abusos da Cheka (precursora da atual KGB). Os anarquistas tiveram de escolher onde ficar. Uma parte atuou com os bolcheviques e acabou se unindo a eles, supostamente preocupada com a eficiência e a unidade contra a reação. Outra parte combateu duramente, defendendo as conquistas da revolução contra o que – aliás, corretamente – viu que estava se desenvolvendo: uma nova classe dominante. O movimento makhnovista na Ucrânia e o levante de Kronstadt foram as últimas batalhas importantes. Em 1921, a revolução antiautoritária estava morta. Essa derrota causou efeitos profundos e duradouros no movimento internacional dos trabalhadores. A esperança dos autores era que tal desastre não aconteceria novamente. Como contribuição, eles escreveram um texto que se tornou conhecido como "A Plataforma". Esse texto sintetiza as experiências do movimento anarquista russo e seu fracasso em construir na classe operária uma presença suficientemente grande e efetiva para frustar a tendência dos bolcheviques e outros grupos políticos de substituírem a classe operária. A Plataforma é um guia necessário para a organização dos anarquistas, caso queiram ser minimamente eficazes. A Plataforma enuncia verdades simples, tais como: uma organização não deve incluir tendências ou grupos que possuam concepções mutuamente excludentes do anarquismo. E assinala que precisamos de estruturas fundamentadas em bases de acordo formais, que definam o papel e a responsabilidade de cada um, deveres de direitos dos militantes etc.; um tipo de estrutura que permita uma grande e efetiva organização. Quando foi publicada pela primeira vez, a Plataforma foi alvo da crítica de algumas das mais conhecidas personalidades anarquistas da época, como Errico Malatesta e Alexander Berkman. Eles a acusaram de estar "apenas um degrau distante do bolchevismo" e de ser uma tentativa de "bolchevizar o anarquismo". Essa reação foi excessiva, mas pode ter sido em parte provocada pela proposta de uma União Geral de Anarquistas. Os autores da Plataforma não explicaram devidamente que tipo de relação deveria existir entre essa organização e os outros grupos de anarquistas. E isto para não dizer claramente que não haveria nenhum problema em que diferentes organizações anarquistas atuassem juntas, nas questões em que compartilhassem um ponto de vista e estratégia. Tampouco, como tem sido dito, por seus difamadores ou alguns de seus companheiros dos últimos dias, a Plataforma é um programa para "levar o anarquismo a um comunismo libertário". Os dois termos são completamente intercambiáveis. A Plataforma foi escrita para apontar precisamente a razão do fracasso dos anarquistas Russos em sua confusão teórica; e, portanto, na falta de uma coordenação nacional, na desorganização e incerteza política. Numa palavra: ineficiência. Ela foi escrita para abrir um debate no interior do movimento anarquista. Ela destaca, sem nenhum compromisso com políticas autoritárias, para a necessidade vital de criar uma organização que combinará uma atividade efetivamente revolucionária com princípios anarquistas fundamentais. A Plataforma não é hoje um programa perfeito, tampouco o foi em 1926. Ela tem suas fraquezas. Não explica nem aprofunda suficientemente algumas de suas idéias, e pode-se mesmo dizer que não acrescenta nada sobre algumas questões importantes. Mas lembrem-se de que ela é um panfleto e não uma enciclopédia com 26 volumes. Os autores deixaram bem claro, em sua introdução, que a Plataforma não é nenhuma espécie de 'bíblia'. Não é, também, uma análise completa ou um programa, mas uma contribuição para um debate necessário - um bom ponto de partida. Para que ninguém duvide de sua relevância atual, deve ser dito que as idéias básicas de "A Plataforma" ainda são mais avançadas do que as idéias que prevalecem internacionalmente no movimento anarquista. Os anarquistas tentam mudar o mundo para melhor, este panfleto indica algumas ferramentas necessárias para essa tarefa. Alan MacSimoin, 1989 Biblioteca virtual revolucionária

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