quarta-feira, 17 de outubro de 2012

CONTRA-REVOLUÇÃO NA ESPANHA - Capítulo 17

Capítulo 17 de « BILAN »: CONTRA-REVOLUÇÃO NA ESPANHA A UNIÃO COMUNISTA As discussões no interior da esquerda comunista e as críticas feitas a Bilan por certos grupos revolucionários têm um peculiar interesse, na medida em que as objeções desses grupos às teses da esquerda “italiana” são certeiras, ainda que no essencial a esquerda italiana compreendesse melhor os eventos da Espanha. Tais eventos frearam ou interromperam a clarificação de diversas correntes. Mesmo as que eram hostis ao antifascismo e à preparação da futura guerra pela União Sagrada - nos blocos que ligam os proletários à burguesia: Frente Popular etc. -, aceitam o antifascismo para a Espanha ou acreditam ver se não uma revolução em marcha, pelo menos uma situação pré-revolucionária. Mas as mais sólidas admitem, desde maio de 1937, que o movimento revolucionário foi vencido, que doravante a guerra da Espanha é uma guerra imperialista e que abre o caminho para a segunda guerra imperialista mundial. A União Comunista, cujo órgão é L’Internationale, situa-se entre a esquerda comunista e o trotskismo, embora tenha se radicalizado consideravelmente depois de 1936. Antes, ela preconizava a frente única (contra a linha “classe contra classe”) ao nível político e sindical [1]. Sabe-se que fidelidade aos “quatro primeiros congressos da I.C.” (1919-1922) é um dos temas favoritos dos trotskistas, e a “frente única” uma de suas palavras de ordem habituais. Em contraposição, a União Comunista rechaça toda defesa da U.R.S.S. e não tem qualquer ilusão sobre o caráter da próxima guerra. Sua contradição: ela prova que a Frente Popular (como a da França) equivale a uma União Sagrada, mas convoca uma frente única com as mesmas organizações ditas operárias. Neste ponto, ela compartilha a incapacidade “centrista” de apreender a função global das organizações “operárias”. Essa atitude repousa também numa superestimação do período que faz acreditar em evoluções possíveis. A União Comunista julga então Bilan como uma posição de princípio afastada do movimento real. Citando Bilan, L’Internationale afirmava em 1934: “Não se trata... para os revolucionários, de deixar as massas operárias entregues à si mesmas e de se contentar em ‘propagar as posições políticas sem que as massas tenham a possibilidade de as aplicar’ (Bilan, no. 12 )” [2]. Por ocasião do referendo que decidiria pela anexação do Sarre à Alemanha (nazista) ou à França, e que se pronunciou finalmente em favor da Alemanha, L’Internationale definiu seu antifascismo, que pretendia ser diferente da versão reformista habitual, mas se parecia muito com ela: “A luta antifascista tem por objetivo conservar as organizações e liberdades que, para o proletariado, são as condições mais favoráveis à propaganda revolucionária e ao reagrupamento das massas... O apego das massas trabalhadoras a certas liberdades democráticas constitue, para os operários, num período de refluxo, uma base importante para reunir as massas e impulsioná-las à ação” [3]. Em julho de 1936, a U.C. evolui, mas ainda com ilusões quanto ao P.O.U.M. (a posição do P.O.U.M. diante do antifascismo democrático), o que demonstra bem que ela mesma não tem uma posição clara sobre esta questão [4]. Depois de julho de 1936, a U.C. já não considera que o atrelamento das milícias ao Estado anula seu caráter revolucionário e até sublinha a existência de um possante movimento revolucionário subterrâneo, que nenhuma organização exprime nem unifica (nem mesmo o P.O.U.M.), e que é necessário apoiar. Para Bilan, ao contrário, a condição necessária para facilitar uma evolução revolucionária possível é, seja como for, compreender e afirmar que ainda não há revolução. L’Internationale enfatiza, porém, desde o início, a fragilidade do movimento. Em fevereiro de 1937, “o estrangulamento do movimento revolucionário espanhol está sendo finalizado”: “as forças contra-revolucionárias querem evitar uma resposta organizada das massas” contra esse estrangulamento [5]. A influência staliniana progredia com o apoio russo, e a República preparava um acordo com Franco. A alternativa é uma batalha decisiva: “ou a destruição do Estado burguês ou uma heróica derrota”. Mas persiste a ilusão quanto ao P.O.U.M., através de sua organização juvenil. A Juventude Comunista Ibérica propunha um “governo operário revolucionário” eleito por uma “assembléia de delegados dos comitês de empresa, dos camponeses e dos milicianos”. Mas que significa “Todo o poder aos sovietes!”, quando os partidos reformistas exercem um domínio esmagador sobre esses órgãos de base? Reencontramos aqui toda a orientação do P.O.U.M. A U.C. mostra a progressão contra-revolucionária, mas não a realidade (= a fraqueza) do movimento proletário. Ela explica antes de tudo essa progressão pela intervenção russa, o que a dispensa de se interrogar sobre a situação interna de Espanha, e a ação efetiva dos operários. A U.C. argumenta como se existisse um movimento social revolucionário manipulado pelos partidos e sindicatos. Ela insiste que “a independência de ação” diante do governo, não sobre o que é esse governo [6]. Ela aponta um “poder operário” (oposto ao poder burguês atual) como objetivo, mas não vê que tal poder é a condição de toda luta de classe contra Franco e a República. Ela procura a revolução lá onde a revolução não está, e os revolucionários onde nada mais há do que a frase revolucionária, exigindo que o P.O.U.M. seja coerente em suas palavras e seus atos. Em suma, ela relança a “frente única” que sustentara antes, sobre o P.O.U.M. e a C.N.T.-F.A.I. E apela à base do P.O.U.M. como os trotskistas às bases dos P.C. e P.S., ignorando a função desses partidos. Ela analisa menos o que se passa do que aquilo que gostaria que se passasse – traço comum a todos os revolucionários criticados por Bilan. Para uma luta revolucionária que não existe (pelo menos, não como dizem), estão prontos a participar de uma luta bem real, dirigida pelo Estado. Presumindo que os eventos devem evoluir, conclui que eles podem evoluir e, portanto, que é necessário sustentá-los. Reconheçamos, contudo, à U.C. um relativo pessimismo quanto ao desfecho, o que refuta sua tese de um “movimento revolucionário ativo” em Espanha. A U.C. começa participando no Comitê para a Revolução Espanhola (cf. § anterior), que reagrupa o essencial da confusão centrista, inclusive a Esquerda Revolucionária, oposição de esquerda na S.F.I.O. - cujo chefe Pivert responde pela informação no governo Blum, o que dá a medida de sua oposição [7]. Em meados de 1937, a U.C. abandona esse Comitê, entre outras razões, devido à presença da E.R. Depois de maio de 1937, L’Internationale descreve longamente o triunfo contra-revolucionário, mas discerne melhor o efeito do que a causa: “desde as jornadas de maio, a guerra contra Franco perdeu o caráter de guerra civil que tinha desde 19 de julho de 1936... à medida que o movimento revolucionário... recua diante da contra-revolução ‘democrática’, o caráter imperialista e militar da guerra se acentua, crescendo a ameaça de guerra mundial” [8]. Ela prognostica um compromisso Franco-República. Ela se rejubila com a evolução positiva dos Amigos de Durruti, que, mesmo não assumindo a posição marxista sobre o Estado, entenderam, segundo a U.C., que “a conquista do poder político é a condição do sucesso da revolução”. Os textos dos Amigos de Durruti que ela reproduz – analisados no § “O anarquismo de esquerda” – mostram que essa avaliação é muito exagerada. Em contraposição, L’Internationale condena a atitude “hesitante” do P.O.U.M. e seu “oportunismo” alinhado com a C.N.T.: apesar dos golpes que recebe, o P.O.U.M. se limita a refutar as mentiras e prega um governo U.G.T.-C.N.T. “É bem pouco provável que uma nova grande batalha possa ocorrer. As jornadas de maio foram decisivas. Somente lutas parciais, localizadas, se produzirão e serão seguidas de repressões massivas.” Notas: [1] L’internationale. no. 3, 13 fevereiro de 1934. Um de seus militantes, H. Chazé (= Davoust) resume a história desse grupo numa carta de 5 de maio de 1975, para La Jeune Taupe, no. 6, julho de 1975. Ele afirma que a U.C. era «claramente contra o frentismo», e que suas posições sobre Espanha foram deturpadas na coletânea La légende de la gauche au pouvoir (cf. nota 6). Comparem-se essas duas afirmações com o texto da U.C. publicado na presente obra. [2] No. 10, 12 de dezembro de 1934. [3] No. 10, 12 dezembro de 1934. [4] No. 21, 23 de maio de 1936. [5] No. 26, 12 de fevereiro de 1937. [6] No. 27, 10 de abril de 1937. [7] Cf. D. Guérin, Front Populaire, révolution manquée – Maspero; e J. Rabaut, Tout est possible! - Denoël, 1974. Como R. Lefeuvre, animador das Ed. Spartacus e de Masses, esses dois autores militaram no Partido Socialista Operário e Camponês, fundado em 1938, depois da exclusão da Esquerda Revolucionária da S.F.I.O. Pivert retornará à S.F.I.O. depois de 1945. Sobre a esquerda da Frente Popular, cf. a coletânea de Rioux, Révolutionnaires du Front Populaire - U.G.E., 10/18. Sobre os revolucionários em oposição à Frente Popular, cf. La légende de la gauche... [8] L’internationale, no. 29, 10 de julho de 1937. Próximo capítulo: A LIGA DOS COMUNISTAS INTERNACIONALISTAS Biblioteca virtual revolucionária

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